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PCD e Empregabilidade: por onde começar a questionar?

Por Laura Bing*






Você já se viu diante dessas duas situações: surpresa por ver alguma pessoa com qualquer deficiência fazendo atividades cotidianas? E o contrário, se vendo na exaltação de que a pessoa com deficiência é simplesmente incrível por conseguir fazer algo que você também faz?


Calma, você não é a única pessoa com essas reações! Sabemos que combater o preconceito é importante, mas também sabemos que é essencial reconhecer nossas próprias reproduções pois certamente você não criou isso sozinha ou sozinho. É por isso que com bastante delicadeza e informação nós decidimos abordar a temática da deficiência não apenas como existente nos outros, mas que esse preconceito existe principalmente em nós mesmos - inclusive em quem escreve esse texto. É com esse desassossego que decidimos fazer algo: um estudo sobre empregabilidade de pessoas com deficiência.


Todo mundo já se deparou com as dificuldades de se inserir no mercado de trabalho. E estamos falando de toda a trajetória: ir atrás de um curso de capacitação, seja graduação ou uma formação técnica, fazer o primeiro currículo, ir atrás das vagas da área, ir para entrevistas, ser aprovado ou rejeitado em processos seletivos. E não para por aí, depois dessa primeira, e árdua etapa, estamos diante de dificuldades como rotinas de trabalho, horas no transporte até o escritório, afinar a colaboração em equipe, prazos para entregas, ou no caso do mundo de trabalho pós-pandêmico, a necessidade de adequação para tantas plataformas de reunião. Mas você já parou para pensar como é fazer toda essa jornada, que em si já possui muitos obstáculos, possuindo alguma deficiência sensorial, de mobilidade ou cognitiva?


Pois 8,4% da população brasileira acima de 2 anos de idade possui algum tipo de deficiência, segundo dados da PNS, Pesquisa Nacional de Saúde, do IBGE. Isso equivale a 17,3 milhões de pessoas no território brasileiro com algum tipo de deficiência.


Mais questionamentos: Ao olhar o seu ambiente de trabalho, você já reparou se você possui colegas de trabalho que possuem algum tipo de deficiência? E o ambiente de trabalho é receptivo para essas pessoas com tais condições, desde o trabalho remoto - se utiliza ou não plataformas mais acessíveis - até o trabalho presencial - por exemplo, se existem condições de receber pessoas com deficiência, observando se existem rampas, espaços de circulação ou até mesmo maçanetas do banheiro que sejam pensadas para todas as funções motoras?


Pois saiba que, segundo a Lei de Cotas para PCD 8213/91, promulgada em julho de 1991 - há mais de 30 anos - as empresas com quadro acima de 100 trabalhadores têm a obrigatoriedade de empregar, proporcionalmente à quantidade de funcionários, 2% a 5% de pessoas com deficiência. Todavia, de acordo com dados de 2019 do Radar SIT, conhecido como o Painel de Informações e Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil, apenas 53% das empresas do Brasil respeitam as porcentagens de empregabilidade PCD.


Ainda em dados de 2019 do Radar SIT, enquanto o nível de ocupação da população acima de 14 anos de idade e sem deficiência era de 60,4%; entre as pessoas com deficiência o nível de ocupação é de 25%. Em dados da edição de 2020, com ano-base 2019, da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), existem cerca de 535 mil trabalhadores PCD com vínculo empregatício formal. Isso significa que apenas 1,1% da força trabalhadora no Brasil - em vínculos formais - é composta por algum PCD.


Mas por que será que apenas 1,1% da população trabalhadora no Brasil é PCD? Seria o preconceito de não achar que essas pessoas são capacitadas para a vaga? Seria pela falta de formação desses profissionais? Seria pela falta de acessibilidade na divulgação de vagas?


De acordo com a pesquisa “Pessoas com Deficiência e o Mercado de Trabalho” realizada em 2019 pelo Ibope Inteligência, sob encomenda do Ministério Público do Trabalho, 77% dos trabalhadores PCD nunca havia sido promovidos, 70% nunca recebeu aumento salarial por seu desempenho e 68% nunca fizeram cursos de qualificação oferecidos pela empresa.


Em outra pesquisa, conduzida pela Secretaria de Direitos da Pessoa com Deficiência do Estado de São Paulo, realizada entre dezembro de 2020 e janeiro de 2021, 15% dos entrevistados de 18 a 64 anos nunca ingressaram no mercado de trabalho, sendo que 66% deles afirmaram ter esbarrado em dificuldade em momentos de ingressar nesse universo.


Por isso, quando pensamos em empregabilidade de pessoas com deficiência, precisamos pensar em mais uma pergunta: qual é a diferença entre inserção e inclusão? A inserção é o movimento que normalmente pensamos, que representa apenas contratar uma pessoa com deficiência e não pensar em como receber as suas especificidades, sejam elas quais forem. Ou seja, é que a pessoa busque se adaptar às condições que o grupo vive. Já a inclusão seria a sensibilização do grupo, através de medidas efetivas, de se adequar aos colegas com deficiência. Mas quais são as políticas possíveis, em instituições públicas e privadas, que sejam efetivamente inclusivas?


O reconhecimento de direitos e de políticas que visam a equidade de pessoas com e sem deficiência é nova na história do Brasil. Foi em 06 de julho de 2015 que foi instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência. Inclusive a Lei nº 13.146 possui um capítulo inteiro, chamado “Do Direito ao Trabalho”, apenas para a esfera do exercício laboral na vida de uma pessoa PCD:


Art. 34. A pessoa com deficiência tem direito ao trabalho de sua livre escolha e aceitação, em ambiente acessível e inclusivo, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.


§ 1º As pessoas jurídicas de direito público, privado ou de qualquer natureza são obrigadas a garantir ambientes de trabalho acessíveis e inclusivos.


§ 2º A pessoa com deficiência tem direito, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, a condições justas e favoráveis de trabalho, incluindo igual remuneração por trabalho de igual valor.


§ 3º É vedada restrição ao trabalho da pessoa com deficiência e qualquer discriminação em razão de sua condição, inclusive nas etapas de recrutamento, seleção, contratação, admissão, exames admissional e periódico, permanência no emprego, ascensão profissional e reabilitação profissional, bem como exigência de aptidão plena.


§ 4º A pessoa com deficiência tem direito à participação e ao acesso a cursos, treinamentos, educação continuada, planos de carreira, promoções, bonificações e incentivos profissionais oferecidos pelo empregador, em igualdade de oportunidades com os demais empregados.


§ 5º É garantida aos trabalhadores com deficiência acessibilidade em cursos de formação e de capacitação.


Art. 35. É finalidade primordial das políticas públicas de trabalho e emprego promover e garantir condições de acesso e de permanência da pessoa com deficiência no campo de trabalho.


Parágrafo único. Os programas de estímulo ao empreendedorismo e ao trabalho autônomo, incluídos o cooperativismo e o associativismo, devem prever a participação da pessoa com deficiência e a disponibilização de linhas de crédito, quando necessárias.



Ainda que existam todos esses dados e leis, você provavelmente chegou até aqui dizendo que não trabalhou em equipe com pessoas com deficiência. Ou, se houve algum colega com deficiência, não eram cargos de liderança ou de grande decisões institucionais. Então, para onde vão as pessoas com deficiência quando se trata de mercado de trabalho?


Quais são os principais destinos da população com deficiência no mercado de trabalho? No caso daquelas que nunca procuraram uma ocupação profissional, quais são os seus motivos? Quais os reconhecimentos, ou não, que possuem no mundo profissional? E mais importante: quais são os seus desejos quando almejam uma carreira?


São com essas perguntas e inquietações que estamos desenhando nosso próximo projeto de pesquisa, dessa vez sobre empregabilidade de pessoas com deficiência! Acompanhe a NOZ Inteligência no Instagram e Linkedin para acompanhar mais questionamentos que buscam interlocução e também a divulgação dessa pesquisa que trabalhará com dados exclusivos!


Laura Bing

Cientista Social formada na FFLCH-USP com inclinação para a área de sociologia.

Antes de trabalhar com pesquisa, atuou por cerca de 10 anos na área cultural, em espaços como editoras, orquestras e museus. Além de pesquisadora na NOZ, divide seu tempo com os estudos de psicanálise no Instituto Sedes Sapientiae e em clínica.

Se interessa por questões sociais e de tecer perguntas sobre o impacto que existe sobre o indivíduo.


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